Tite, técnico da Seleção Brasileira, iniciou sua carreira em 1978, como volante do Caxias, time gaúcho. De lá para cá, sua trajetória sofreu reviravoltas: precisou se aposentar precocemente, após lesões no joelho; formou-se em educação física e virou técnico do Guarany de Garibaldi. Seus triunfos foram de uma conquista da segunda divisão gaúcha, em 1993, até o campeonato mundial de 2012, no comando do Corinthians.
Hoje, como líder de Neymar e companhia, Tite é avaliado sob diferentes aspectos. No ponto de vista psicológico, especialistas elogiam sua inteligência emocional e sua habilidade de compreender os problemas de cada jogador. Analistas de carreira ressaltam também a capacidade de liderança e a preocupação em sempre se dedicar aos estudos, mesmo após chegar ao auge.
A seguir, veja como qualquer profissional – seja um estagiário, seja um chefe – pode observar Tite e se inspirar para ter uma trajetória profissional de sucesso.
Um funcionário que queira construir uma carreira sólida precisa valorizar seus colegas e seus subordinados. Essa característica é essencial, principalmente, para quem ocupa um cargo de chefia: Tite sempre busca enaltecer os pontos fortes de cada jogador.
“Um grande pecado do líder é fazer comparações entre os funcionários – coisa que nosso técnico evita. Ele não vai menosprezar os demais jogadores só porque tem uma estrela como Neymar no elenco”, explica Aurea Regina de Sá, coach de comunicação especializada em media training. “Vai ressaltar o que cada um tem de positivo e ajudar a desenvolver as habilidades individuais.”
Outra lição que Tite pode dar a qualquer profissional é colaborar para a criação de um bom ambiente de trabalho. Os funcionários tendem a ser mais produtivos quando o expediente não é movido a relações conflituosas ou a tensões desnecessárias. Ser lembrado como uma “boa pessoa para se ter na equipe” pode gerar oportunidades interessantes no mercado.
É importante, portanto, ao longo da carreira, buscar uma relação saudável com os colegas – evitar fofocas, brigas ou respostas ríspidas.
Nell Salgado, coach de atletas de alta performance, conta que o técnico da Seleção cultiva um clima salutar ao demonstrar preocupação constante com a equipe. “Os jogadores se sentem importantes. Tite quer saber como está a saúde de cada um, se alguém está com dor. Ele sabe ouvir e criar uma família ali”, afirma.
Flávio Rebustini, professor e coordenador do curso de psicologia do esporte na Universidade Estácio de Sá, afirma que saber equilibrar a vida emocional com a profissional faz com que um jogador – ou qualquer funcionário – trabalhe mais feliz. E isso aumenta o rendimento durante o expediente.
“Tite deu um prazo para que os atletas resolvessem questões de seus clubes e focassem só na Copa. Permitiu também que eles vejam as esposas e os filhos durante a competição”, diz. “Isso é saudável. Aquele conceito que existia de concentração não existe mais. Deixar um atleta com saudades da família não é bom”, completa.
Roberto Costa, sócio-diretor da Clave Consultoria, diz que o conceito de separar totalmente a vida pessoal da profissional é ultrapassado – justamente por ser um objetivo intangível. “Antes, o certo era não levar problemas de casa para o emprego e do emprego para a casa. Mas o ser humano não consegue fazer isso. O que é possível é buscar o equilíbrio”, diz.
“Nossas pesquisas mostram que, seja o estagiário ou o funcionário de 60 anos, ele vai trabalhar mais motivado se sentir que consegue conciliar as duas partes”, conta Roberto. É o caso, por exemplo, do chefe que permite uma flexibilidade maior no horário de quem tem filhos ou de um funcionário que quer fazer um curso e precisa entrar mais cedo.
Tite mostra essa compreensão. “Se um jogador perdeu o pai, o técnico precisa ter uma abordagem para ajudar a pessoa. Só a cobrança faz com que o funcionário se sinta incompetente por não estar rendendo”, explica Aurea.
O funcionário que consegue ascender na carreira não pode ser pedante e perder a humildade. Tite, em seus discursos, busca reforçar que iniciou sua carreira em um time da segunda divisão gaúcha.
“Ele busca essa humanização. Não se mostra como infalível, não deixa o sucesso subir à cabeça. Fala que tem medo – e isso ajuda a criar empatia no torcedor. Mostra que está fazendo seu melhor, mas não garante que seus desejos serão atendidos. É sempre pé no chão”, diz Katia Rubio, psicóloga do esporte e professora na Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo (USP).
Saber lidar com situações de estresse e de pressão é uma habilidade que costuma ser valorizada pelas empresas. “É uma qualidade de um bom líder manter a tranquilidade. Não é uma competência emocional fácil de ser desenvolvida. Tite, mesmo após uma derrota, vai a uma coletiva de imprensa e não desconta no jornalista ou no torcedor. Não acusa ninguém e sabe ser equilibrado”, explica o coach e consultor de carreira Emerson Weslei Dias.
Mesmo após críticas ao time e especialmente a Neymar, na partida contra a Costa Rica, o técnico não foi ríspido nem demonstrou descontrole emocional em entrevistas. É um comportamento oposto ao de Dunga, seu antecessor. Isso diminui a pressão sentida pelos atletas. “Tite busca o que ele chama de equilíbrio – se preocupa em nunca perder a linha. É um cuidado especial”, explica Celso Unzelte, jornalista esportivo e historiador.
O autocontrole em situações extremas é considerado até em processos seletivos. “Procuramos sempre pessoas objetivas, que demonstrem maturidade nesses contextos de estresse da equipe”, diz Roberto, da Clave Consultoria.
Em uma analogia com o mercado de trabalho, Tite poderia ser lembrado como um colega que, mesmo diante de frustrações, não culpa a equipe nem perde o controle da situação.
Para subir na carreira, é importante seguir a educação continuada – e não parar na graduação. Tite mostra que, mesmo como técnico da Seleção, continua se instrumentalizando. “Ele é obcecado. Acompanha jogos de futebol, observa outros técnicos. Segue um padrão semelhante ao do Bernadinho, do vôlei, ou ao de Ayrton Senna”, explica Celso Unzelte. “Quando fez um período sabático, se preocupou em sempre ficar antenado com as tendências do futebol mundial.”
Apesar de os estudos serem indiscutivelmente importantes, o consultor Emerson alerta: não basta fazer cursos apenas para colecionar diplomas. “Um bom profissional não só estuda, como também aplica o que aprende. Isso é fundamental”, diz.
Fonte: G1.